9 de setembro de 2012

"Nó de 4 Pernas" desatado por Joel Cardoso




"Joel Cardoso, pesquisador sobre as Poéticas da Modernidade (com ênfase nas relações criadas entre palavra e imagem (ex: Teatro e Cinema), Pós-Doutor em Artes (Cinema e Literatura) e Doutor em Letras (Literatura Brasileira e Intersemiótica), escreve critíca sobre o espetáculo Nó de 4 Pernas."

 

                                                                    Foto: Cássio França
    


Ontem, 6 de setembro, a convite de Bene Martins, amiga de priscas eras, companheira de jornadas acadêmicas e de vida, fui assistir à peça "Nó de 4 pernas". Tive a grata satisfação, ainda, de estar na companhia de Luiz Guilherme e Dani Pimentel, amigos diletos. A peça, baseada em obra do veterano Nazareno Tourinho, comemorando os seus 50 anos de publicação, na realidade, 51, ganha agora as luzes dos refletores sob a direção de Alyne Goes e Enoque Paulino.
No palco, um sacristão e uma beata, um padre - ainda muito jovem - recém-chegado à paróquia; um sacristão e uma beata (ele, esgueirando-se e se escondendo por detrás de uma falsa castidade; ela, viúva e carente, em estado de ebulição); um prefeito e a sua primeira dama (exemplos em que se alternam lances de oportunismo e hipocrisia social); uma prostituta e um operário. Pronto! Eis aí um cenário para fazer girar uma trama minuciosamente armada, como um quebra cabeça em que as peças, pouco a pouco, vão se encaixando, formando um divertido mas não menos delicioso painel social. Eis, pois, um tripé em que se espreitam posturas políticas (quase sempre escusos), interesses sociais (em que se revesam apetites sexuais proibidos e reivindicações cidadãs, com direito à menção à greve, inclusive) e, permeando todo esse embrulho, o sexo (reprimido ou descaradamente expresso). O texto é primoroso, com algumas tiradas geniais. Os resultados obtidos no palco são fantásticos. Retornando aos primórdios do nosso teatro autenticamente brasileiro, nos moldes de Martins Pena, mas um Martins Pena, renovado, provocador, a peça, com humor ágil e inteligente, a peça traz para a cena alguns elementos muito atuais do cenário brasileiro. Referimo-nos às estratégias políticas (nem sempre politicamente corretas), às preocupações religiosas (remontando a uma teologia libertária). Os fins justificam os meios. No final, em meio aos sustos, tudo termina bem.
A representação proposta deliberadamente para a caracterização das personagens, viabilizada pela interpretação dos atores (marcante, forte, precisa), oscila entre o sério e o cômico, evidenciando, por vezes, uma caricatura acentuada. Interpretar é isso: caracterizar, estar no lugar de... convencer como tipo, como pessoa... conferir identidade, autenticidade... Embora a
personagem do padre detenha a maior parte das falas (mérito para o ator que, mesmo com o excesso de texto se sai muito bem) quem rouba a cena é, indubitavelmente, o sacristão (em caracterização primorosa).

O espetáculo, com duas horas de duração, intersemioticamente transita entre diversas linguagens, pondo, separando dos atos, em cenas em vídeo, cujo objetivo é, com imagens significativas, mostrar uma outra dimensão social da trama relatada. A música, especialmente composta para a apresentação, é bela e pontua a narração brilhantemente. Enfim, é um espetáculo imperdível. Recomendo!...


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